Sentir ansiedade antes de uma entrevista, prova ou conversa importante é algo natural. O problema começa quando esse estado de alerta se torna constante, intenso e começa a atrapalhar o dia a dia — afetando o sono, o trabalho e os relacionamentos. Essa é a realidade de milhões de brasileiros. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil tem a maior taxa de transtornos de ansiedade do mundo: cerca de 9,3% da população é diagnosticada com o problema, mais que o dobro da média global.
Um estudo da Revista Brasileira de Psiquiatria, com base em dados do Ministério da Saúde, aponta que 27,4% dos adultos brasileiros vão desenvolver algum tipo de transtorno ansioso ao longo da vida. As mulheres (32,5%) e os jovens adultos estão entre os mais afetados — um sinal de alerta importante para políticas públicas e cuidados preventivos.
“A ansiedade, em si, não é um problema”, afirma o psiquiatra Dr. Thyago Henrique, especialista em saúde mental pelo Hospital Israelita Albert Einstein. “Ela é um mecanismo de defesa, que nos prepara para lidar com ameaças. Mas, quando aparece em excesso, atrapalha a rotina e gera sofrimento, já estamos falando de um transtorno.”
Ademais, segundo o especialista, a linha que separa a ansiedade comum da patológica está na perda de funcionalidade. Por isso, quando a pessoa começa a evitar situações, tem sintomas físicos recorrentes (como dor de cabeça, taquicardia ou falta de ar) ou não consegue se concentrar, é hora de buscar ajuda. “A ansiedade patológica paralisa. Ela prende a pessoa em um medo constante do que pode dar errado”, explica.
Formas diferentes, sintomas parecidos
Os transtornos de ansiedade podem se apresentar de várias formas: o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), a fobia social, o transtorno do pânico, entre outros. Um estudo da USP revelou que até 28% dos moradores das grandes cidades brasileiras já enfrentaram algum desses quadros ao longo da vida.
Além disso, os sintomas, no entanto, podem ser confundidos com outras condições, como depressão ou transtorno de déficit de atenção (TDAH). “Muitas vezes, a dificuldade de concentração é atribuída a TDAH, quando na verdade é ansiedade”, alerta Dr. Thyago. “O diagnóstico correto é essencial para o tratamento adequado.”
Vida acelerada, redes sociais e pandemia: combinação perigosa
A rotina moderna, marcada por excesso de estímulos, hiperconexão digital e pressão constante por produtividade, tem contribuído para o aumento dos casos. “Estamos expostos a um volume de informações que o cérebro humano não foi feito para processar”, diz o psiquiatra. “Essa sobrecarga altera o funcionamento de áreas cerebrais responsáveis pela regulação emocional.”
Contudo, os jovens, especialmente após a pandemia, são os mais afetados. Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostrou aumento significativo de sintomas ansiosos entre adolescentes e jovens adultos durante e após o isolamento social. O uso excessivo das redes sociais, a comparação constante com os outros e a incerteza sobre o futuro formam um terreno fértil para o surgimento da ansiedade.
Tem tratamento — e ele funciona
Apesar dos números preocupantes, a boa notícia é que os transtornos de ansiedade têm tratamento eficaz. A combinação de psicoterapia — especialmente a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) — com medicamentos, quando necessário, é a abordagem mais recomendada.
“A TCC ajuda o paciente a identificar padrões de pensamento distorcidos e substituí-los por pensamentos mais realistas. Portanto, já a medicação, quando usada corretamente, ajuda a estabilizar os sintomas”, explica o especialista.
Além da terapia, mudanças no estilo de vida fazem toda a diferença. Por isso, praticar atividades físicas, manter uma alimentação equilibrada, dormir bem, meditar e usar técnicas de respiração são práticas que fortalecem a saúde mental. “Em casos leves, só essas medidas já podem ser suficientes”, diz Dr. Thyago.
E a pergunta que não quer calar: ansiedade tem cura?
Depende. “A palavra cura pode não se aplicar a todos os casos, mas falamos em controle. Com o tratamento certo, a pessoa recupera sua qualidade de vida, sua produtividade e sua capacidade de estar presente no agora — que é, afinal, onde a vida acontece”, conclui o médico.
Sobre o especialista:
Dr. Thyago Henrique é médico psiquiatra, especialista em saúde mental e mestrando em neurociências. Atua na promoção da saúde emocional com foco em linguagem acessível e humanizada, tanto no consultório quanto nas redes sociais.
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