Na quarta-feira, 02 de abril, foi votada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado a proposta presente no Projeto de Lei Complementar nº 112/2021 (PLP 112/2021), que apresenta alterações para melhorar o combate à violência de gênero na política, a reserva de 20% de cadeiras para as mulheres em todas as esferas e a flexibilização da obrigatoriedade de 30% de candidaturas femininas nas eleições proporcionais.
Vou me ater aqui aos itens quantitativos.
Como consultora político-eleitoral e coordenadora de campanhas, observo que essa proposta representa uma perda na promoção da paridade de gênero na política brasileira.
As cotas de gênero foram estabelecidas para corrigir desigualdades históricas e fomentar uma democracia mais representativa.
E pode ser que você pense: “Mas não era a reserva de cadeiras que as mulheres queriam?”.
Respondo que sim. Essa é uma boa notícia.
No entanto, preciso lembrar que 20% não é suficiente para representar 52% da população, principalmente sem uma estrutura de progressão e incentivos que realmente transformem a nossa cultura.
Sem isso, não há como extinguir essa política afirmativa em 20 anos, prazo que também está estipulado no Novo Código Eleitoral.
A má notícia é que há uma tentativa de silenciar nossos pedidos com uma reserva de cadeiras insuficiente, enquanto, em outro item, resolve-se por completo um problema dos partidos.
Atualmente, a prática de candidaturas femininas fictícias, conhecidas como “candidaturas laranjas”, tem sido uma preocupação constante.
Partidos políticos, em diversas ocasiões, têm utilizado essa artimanha para cumprir formalmente a cota de gênero sem, de fato, promover a participação feminina.
Contudo, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) identificou fraudes à cota de gênero em 14 municípios de seis estados brasileiros nas eleições de 2020, resultando na cassação de candidaturas e mandatos.
Como funciona isso? Se uma candidatura laranja for identificada na chapa do partido X, os candidatos eleitos desse partido perdem os mandatos.
Após 24 mandatários perderem suas cadeiras no Brasil, esse medo tem assombrado os partidos.
Entretanto, a solução para esse problema não deve ser a flexibilização ou eliminação das cotas.
A retirada da obrigatoriedade da cota de 30% na formação da chapa partidária penaliza injustamente as mulheres, transferindo para elas as consequências das irregularidades cometidas pelos partidos.
É fundamental reconhecer que são os próprios partidos que selecionam candidaturas fraudulentas, deixam de investir em formação política adequada e não incentivam honestamente o crescimento de lideranças femininas.
Além disso, o projeto apresenta uma proposta de cálculo eleitoral ainda mais confusa e desvantajosa do que a atual, tornando o sistema eleitoral menos transparente e acessível.
As novas regras sugeridas criam um cenário, arrisco dizer, humilhante para as mulheres, ao inserir três cálculos diferentes da sobra até o preenchimento das cadeiras.
Como se não bastasse, o PLP ainda propõe a convocação de novas eleições, caso a sobra não preencha todas as cadeiras, desvalorizando a importância da participação feminina na política.
Me parece que optaram por rebaixar e piorar o sistema eleitoral para colocar sobre nós esse jugo, em troca de livrar os partidos da possibilidade de ter a chapa cassada e permitir que continuem sem investir na participação feminina.
Não há ganho real para as mulheres.
Enfim, diante da iminente votação, de relatoria do senador Marcelo Castro (MDB/PI), é crucial que os legisladores considerem os impactos negativos que a flexibilização das cotas de gênero pode acarretar para a representatividade feminina na política brasileira.
A manutenção e o aprimoramento das políticas de inclusão são indispensáveis para a construção de uma democracia mais justa e igualitária.
Hanna Pereira é consultora político-eleitoral, mentora e coordenadora de campanha. Também atua como educadora cívica com mais de 900 e-books vendidos e 300 lideranças formadas no Brasil. Foi idealizadora do Movimento Elas na Política na Baixada Santista. Contribuiu em campanhas federais, estaduais e municipais, elegendo prefeito e vereadores.
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