Nas sombras das ruas, os pedidos de socorro ecoam em silêncio, enquanto o mundo, impassível, se recusa a ouvir.
Nas paredes dos lares, nos cantos esquecidos, imersos na penumbra das cidades, mulheres vivem prisioneiras de um silêncio que jamais escolheram.
A violência se reinventa a cada dia.
O stalking torna-se uma sombra constante; a violência psicológica corrói a alma; o assédio moral e sexual sufoca com crueldade; e o estelionato sentimental manipula, destruindo sonhos e vidas.
Cada agressão, seja física ou verbal, imprime cicatrizes invisíveis – marcas de um sistema que ainda não oferece proteção plena a suas vítimas.
Em meio a esse cenário de dor e desamparo, a legislação tenta, com rigor, acompanhar o clamor por justiça.
A Lei do Feminicídio (13.104/2015) celebra agora uma década de combate à barbárie.
Além disso, a Lei 14.994/24, conhecida como Pacote Antifeminicídio, impõe penas de até 40 anos para os responsáveis e estabelece condições agravantes que podem aumentar a punição em até um terço, especialmente quando o crime é cometido durante a gestação, nos três meses posteriores ao parto ou na presença de pais e filhos da vítima.
Outras penalidades foram reforçadas para os casos de lesões corporais, crimes contra a honra, ameaças e descumprimento de medidas protetivas.
Em situações de saídas temporárias – os chamados “saidões” –, o agressor é obrigado a usar tornozeleira eletrônica, perdendo o direito a visitas conjugais.
A progressão de regime só ocorre após o cumprimento de, no mínimo, 55% da pena (ou 50% para homicídios), e a sentença retira do agressor não apenas o convívio familiar, mas também a possibilidade de ocupar cargos públicos, até o cumprimento integral de sua punição.
Mesmo com esses avanços, a dor permanece oculta – escondida atrás de portas trancadas, refletida em olhos que evitam o espelho e silenciada em vozes que não encontram forças para se erguer.
Não basta enxergar essa escuridão; é preciso acender uma luz intensa.
Romper o silêncio, oferecer um acolhimento que renove a esperança e fortalecer redes de apoio para amparar cada mulher que, por tanto tempo, se sentiu sozinha.
Porque o respeito não se suplica – ele se impõe. Porque a coragem não nasce do medo – ela se fortalece no apoio.
E, acima de tudo, porque toda mulher merece muito mais do que simplesmente sobreviver: ela merece, enfim, viver.
Raquel Gallinati é diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e secretária de Segurança Pública de Santos
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