Minha infância foi relativamente tranquila.
O que mais me incomodava era o assédio moral sofrido na escola e o terrorismo dos que anunciavam o fim do mundo de porta em porta para quem não aderisse às suas religiões.
A gente aprendia a superar tudo isso sem que ninguém fizesse nenhum diagnóstico ou recorresse à Justiça.
Até seria bom, mas a maturidade obtida por meio da resiliência e da vontade de enfrentar problemas talvez nunca existisse, dando lugar ao vitimismo.
As más influências eram combatidas por pai e mãe, sem transferir suas responsabilidades para terceiros.
Uma bronca, um castigo, uma chinelada ou um simples olhar educavam.
Na escola, as consultas eram feitas nas bibliotecas; líamos obras da cultura brasileira e portuguesa.
Em casa, meu pai me dava um livro sempre que minhas notas superavam a média nove, geralmente clássicos internacionais.
Quem tinha recursos comprava enciclopédias como Barsa ou Delta-Larousse.
Meu pai, com muito esforço, comprou a “Trópico”.
Viajei pelo mundo, passado, presente e futuro pela leitura!
Eu e muitos de meus colegas aprendemos a ler, entender e escrever melhor por conta desse processo, num tempo em que as escolas públicas reprovavam por mau desempenho e premiavam por excelência.
Meus professores se ocupavam em ministrar suas disciplinas.
Os melhores buscavam identificar potenciais e incentivar seu aprimoramento; os piores, já tentavam nos impor suas crenças.
Jogar bola na rua ou na praia era o passatempo preferido e joelhos ralados eram uma espécie de troféu.
Aprendemos a sonhar e perseguir nossos sonhos; a exigir direitos e cumprir deveres; a enfrentar desafios e a superar nossas limitações.
Nossa adolescência terminava por volta dos quinze anos, quando já começávamos a pensar em profissões a seguir.
Havia modismos e “tribos”, mas eram passageiros e, normalmente, não deixavam sequelas físicas ou mentais, a não ser no caso de vícios, por conta de más influências, que ocorriam em família, mas principalmente por parte de “amigos”.
Andy Warhol profetizava que todos teriam 15 minutos de fama, mas quem tinha muito mais do que isso eram os que atuavam na imprensa escrita, no rádio e na televisão.
Os influenciadores de então eram comedidos e consequentes: tinham escrúpulos.
Porém, também havia os aproveitadores e mistificadores.
Mas eram tão caricatos que ninguém os levava a sério.
Hoje, as más influências são muito mais amplas e perniciosas.
Os “cantos de sereia monetizados” são mais atrativos e sedutores, e ocorrem em vários âmbitos, viciando em drogas, disseminando preconceitos, mentiras e ódios de toda espécie, sobretudo entre jovens sem referências em casa, que acompanham certos “influenciadores” como se fossem “deuses”.
Faz pensar se não seria adequado, em vez de censurar, que as mídias usadas por “influencers” devessem ter a seguinte mensagem: “Cuidado! Isso pode prejudicar sua capacidade de pensar!”.
São tempos sombrios.
Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro, pesquisador universitário e membro da Academia Santista de Letras
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