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07 DE MARÇO DE 2025

Cérebros e intestinos

Adilson Luiz Gonçalves

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Andy Warhol teria profetizado, no final dos anos de 1960, que: “No futuro, todos serão mundialmente famosos por 15 minutos”.

Frases são poderosas, e nem sempre quem ficou famoso por proferi-las foi seu autor.

Mas, como diz a frase emblemática de O homem que matou o facínora (EUA, 1962): “Quando a lenda é maior que o fato, publique-se a lenda”.

Atualmente, com as redes sociais, lendas e narrativas tornaram alguns “influenciadores” instrumentos maliciosos de interesses corporativos, políticos e ideológicos, seguidos por legiões de pessoas que parecem não ter a mínima vontade ou condição de raciocinar.

Com isso, eles têm conseguido muito mais do que “15 minutos de fama”, geralmente endeusando quem lhes dá suporte financeiro ou tem potencial para tanto, e difamando quem contraria seus interesses oportunistas ou crenças.

Isso os caracteriza como seres humanos mais “tóxicos” do que os que criticam, ou, como agora virou moda dizer, “lacram” ou “cancelam”.

Entre paradoxos e hipocrisias, eles se dizem “do bem”, mas disseminam ódio, criando até grupos digitais dedicados a atacar sistematicamente o objeto de sua ira, ou do que são financiados para tentar desacreditar e, até, destruir reputações.

Usando os recursos técnicos disponíveis, esse tipo de pessoa não se importa com as consequências de seus atos, desde que seus objetivos sejam alcançados, com expressivas doses de megalomania, necessidade de autoafirmação, compensações por carências diversas ou oportunismo, ou seja, plenos de paradoxos e contradições.

Não sei quem é pior: quem se arvora “influenciador” ou seus seguidores, que demonstram incapacidade de pensar de forma autônoma, preferindo ser parte do rebanho.

Embora jamais admitam, suas práticas são bem parecidas com as das piores ditaduras da história, de direita ou esquerda: “mentiras repetidas sem vezes”, ou, outra expressão da moda, “imunização cognitiva”. Abominam seletivamente, mas imitam consciente ou inconscientemente.

Muitos de nossos jovens têm dado mais atenção às suas “verdades absolutas”, “lacrações” e discursos de ódio ou idolatria, do que aos livros de história, ou à busca de fontes menos “pessoais”, perdendo progressivamente a capacidade dialética: tese, antítese e síntese.

Com isso, por condicionamento, preguiça cognitiva ou necessidade de pertencer a uma “tribo”, aceitam a tese como síntese, às vezes dogma, se unindo a extremistas históricos de todas as vertentes, passando a recitar por “cartilhas”.

Isso talvez explique o atual momento “cultural”, em que nádegas são mais importantes do que o cérebro, me lembrando de uma fala do personagem de Jean Gabin ao de Alain Delon, em ”Os sicilianos” (EUA/França, 1969): “Seu cérebro está abaixo da cintura”.

Alguns contra-argumentarão que alguns cientistas têm afirmado que o intestino é nosso “segundo cérebro”.

Considerando os modos de expressão de um e outro, dependendo da pessoa, isso faz todo o sentido.

Quando não havia internet, a busca por um “furo” de reportagem destruía a vida de pessoas inocentes, com manchetes bombásticas, baseadas em aparências e suposições.

Descoberta a verdade, os meios de comunicação se desculpavam em pequenas notas, muito apropriadamente publicadas próximas à coluna de obituários.

Isso não mudou muito, aliás. No entanto, as redes sociais abriram espaço para que radicais inconsequentes e imbecis de toda a espécie se manifestem.

Diz o ditado que três coisas não têm volta: a pedra lançada, a oportunidade perdida e a palavra dita.

A solução é censurar as redes sociais?

Se quem propõe isso o quiser de forma seletiva, só vai piorar ainda mais esse triste cenário, transformando-as em meios de doutrinação totalitária, e consequentemente, de discriminação e ódio contra quem não se enquadre.

Daí a queimar livros, censurar ou remover autores que se atrevam a propor antíteses, fazendo pessoas raciocinarem, remete a exemplos conhecidos de regimes totalitários de esquerda e direita.

É fácil, muito fácil condicionar seres humanos. Não faltam instrumentos e exemplos históricos.

A civilização evoluiu na medida em que os instintos dos seres humanos foram aprimorados ou controlados.

Tem sido um caminho duro, sempre sujeito a retrocessos, embora alguns os considerem avanços, de acordo com a conveniência ou intencionalidade do momento.

Dizem que o que nos diferencia dos outros animais é a inteligência, entendida como a faculdade de conhecer, compreender e aprender.

No entanto, isso só será efetivo se resultar em sabedoria, com uma boa dose de empatia, entendida como respeito ao semelhante.

No entanto, consideram a “influência” que alguns exercem na mente de seus seguidores, com suas lendas, teses e narrativas, nas redes sociais e em outros meios de comunicação, a alienação intelectual, que não deixa de ser um tipo de “inteligência artificial”, já está presente e dominante, em seus piores e tristemente duradouros efeitos.

 

Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro, pesquisador universitário e membro da Academia Santista de Letras

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