Na última sexta-feira (1), um incêndio destruiu cerca de 100 casas sobre palafitas no Caminho São Sebastião, no Dique da Vila Gilda, em Santos. A Prefeitura de Santos garantiu, junto ao Governo Federal, R$ 116 milhões para a reurbanização da área atingida pelo incêndio.
Sendo assim, o aporte teve divulgação na terça-feira (5), durante reunião em Brasília (DF) articulada pelo deputado federal Paulo Alexandre Barbosa, com a participação do prefeito Rogério Santos, do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, do ministro das Cidades, Jader Filho, do secretário nacional de Habitação, Helder Barbalho e o presidente da COHAB Santista, Maurício Prado, para tratar de soluções habitacionais e de infraestrutura para os moradores do local.
Triste realidade
Contudo, esse incêndio apresenta uma realidade que nem todos os santistas conhecem. Conforme o último censo do IBGE, o Município tem 46 favelas ou comunidades, onde moram 11% da população. Ou seja, 1 em cada 10 moradores vive em condições degradantes. Ao todo, 46.262 pessoas moram em favelas em Santos.
Aliás, se houvesse um ranking entre os municípios paulistas, os moradores das comunidades de Santos estariam em 147º lugar.
Os dados do IBGE também mostram a discrepância racial. Enquanto os brancos representam 67% da população santista, nas favelas eles são minoria: 39,5%. Já os pardos são quase a metade (47,5%), contra 24,7% na média santista. O total de negros residindo em favelas é praticamente o dobro em relação ao todo da população santista. (12,7% x 6,7%). Desse modo, esses dados mostram a desigualdade social presente em Santos.
Vulnerabilidade
Segundo a assistente social que atua na área de Habitação de interesse social, Thaís Helena, a vulnerabilidade das comunidades como o Dique da Vila Gilda está enraizada em fatores históricos e estruturais (classe, gênero e raça) que associam a pobreza à negligência do poder público.
“A ausência de políticas de habitação no município somada aos aluguéis altos e a especulação imobiliária, força milhares de famílias a ocuparem a margem da cidade, com o risco de incêndios e desastres ambientais. Tudo isso revela uma violência estrutural que naturaliza o risco de vida para populações empobrecidas e racializadas”, expõe Thaís.
Desigualdade social
A assistente social comenta sobre como a desigualdade racial e espacial se manifesta nas favelas de Santos, especialmente considerando os dados que mostram a representação de negros e pardos nas periferias. “Os dados mostram que a população negra santista em sua maioria mora nas favelas. Isso é reflexo de um racismo estrutural que historicamente impede a população negra de acessar os mesmos direitos que a população branca – seja em termos de moradia digna, trabalho formal ou mobilidade urbana. Mas, também evidencia o racismo institucional, quando vemos que a população negra não é atendida nem pela habitação de mercado, nem pela habitação de interesse social”, explica Thaís.
Contudo, ela também recorda que muitas vezes essa segregação racial, ou seja, essa divisão entre bairros maioritariamente brancos e favelas majoritariamente negras, é vista apenas como fruto da pobreza, ou seja, apenas como ricos e pobres. Mas, na verdade, é possível perceber que a pobreza tem cor.
“Por isso, quando falamos que o racismo também é institucional, estamos falando que ocupações como o Dique da Vila Gilda são resultados de políticas públicas e decisões urbanísticas que, ao longo do tempo, empurraram populações negras e periféricas para as margens da cidade – seja no sentido literal, como no Dique da Vila Gilda, ou no simbólico, como a ausência dessas populações nos centros decisórios.
E por mais que digam que todas as vidas importam, no final das contas quem morreu geralmente é a população negra. No final, quem morreu no incêndio carbonizada foi uma mulher negra. Isso mostra quem no final das contas é mais prejudicado com isso”.
Parque Palafitas
Durante o encontro, foi apresentada a proposta de continuidade do Parque Palafitas. O plano prevê a segunda etapa do projeto, além da urbanização completa da região onde viviam as famílias impactadas pelo incêndio. “Com esse recurso podemos avançar com novas infraestruturas, atender imediatamente as pessoas atingidas pelo incêndio e promover habitação para outras pessoas”, disse o prefeito Rogério Santos.
Os recursos são provenientes do Orçamento Geral da União (OGU), com caráter de fundo perdido, ou seja, sem necessidade de reembolso pelos beneficiários. “Desde os primeiros momentos, temos trabalhado por respostas imediatas para os moradores. Essa agenda de hoje foi muito importante e produtiva. A área atingida pelo incêndio será ocupada pelo projeto de reurbanização”, apontou o deputado Paulo Alexandre Barbosa.
Realocação
Se há um plano para a realocação definitiva das famílias afetadas, com garantia de moradia digna e segura, a Prefeitura de Santos comunica que nos últimos anos, foram destinadas 2.145 moradias para pessoas que viviam em palafitas.
Entre essas, parte do núcleo Malvinas, na Vila Alemoa, foi realocada no Conjunto Bananal, com 300 novas moradias. Há mais 934 unidades em andamento (60 no Parque Palafitas, 574 no Santos AB/Prainha II e 300 no Santos Z/Jabaquara). Assim como, mais 1.024 unidades com obras prestes a começar (Santos V/Estradão) – todas para famílias moradoras em palafitas. Além disso, foram selecionados os projetos do programa Novo PAC Periferia Viva. Portanto, com destaque para o recurso já destinado ao São Manoel, o maior do País nesta linha de financiamento.
Infraestrutura
Além disso, sobre os investimentos e programas que a Prefeitura tem implementado nos últimos anos para melhorar a infraestrutura básica (água, esgoto, iluminação, pavimentação) nas favelas da cidade, a Prefeitura informa que vem atuando para oferecer moradias adequadas para a população da Zona Noroeste que vive nesses aglomerados, particularmente na Vila Gilda e no São Manoel. Dessa forma, promovendo regularização fundiária e ações preventivas a novos incêndios, ao mesmo tempo em que promove a urbanização do local. Além das moradias, de 2013 a 2025, também foram realizadas 2.414 regularizações fundiárias, sendo 1.260 desde 2021. Estão em andamento 2.493 regularizações.
Serviços públicos
A Prefeitura informa quais ações estão sendo realizadas para garantir acesso a serviços públicos essenciais como saúde, educação e segurança nas favelas. “No final de julho, a Prefeitura encaminhou um projeto de lei à Câmara Municipal para. Assim como, entre outras alterações na Lei de Uso e Ocupação do Solo, elevar a Vila Gilda à condição de bairro, de modo a reconhecer formalmente a comunidade residente e facilitar o desenvolvimento de políticas públicas específicas”.
Além disso, a transformação em bairro é o resultado da criação de um grupo técnico – primeiro ato da gestão – para promover o processo de urbanização da Vila Gilda. Somam-se aos projetos habitacionais e ao Parque Palafitas, policlínica, Centro da Juventude, Restaurante Bom Prato e campo de futebol em parceria com a Fundação Johan Cruyff. Além do asfaltamento de vias combinado com a perspectiva de universalização do saneamento pela Sabesp.”
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